Dia Mundial do Refugiado e Semana Nacional do Migrante
“Eu te dou coragem, sim, eu te ajudo”
“Não tenhas medo, que eu estou contigo. Não
te assustes, que sou o teu Deus. Eu te dou coragem, sim, eu te ajudo.” (Is
41,10)
São
tantos os gritos e as dores: dos que fogem da guerra civil na Síria, de
milhares de migrantes e refugiados – de países africanos, do oriente médio e de
tantos países - que perderam pessoas queridas tragadas pelas águas do Mar
Mediterrâneo, na tentativa de chegar à Europa. Intolerâncias religiosas,
étnicas e outras formas de rechaço, discriminação e de vulnerabilidade social
expõem milhões de pessoas a condições de extremo sofrimento, de abandono, de
morte em alto mar, em desertos, em caminhos à busca de simplesmente de
sobrevivência. É fácil fechar os olhos ou adotar uma atitude de indiferença! Algumas
vezes dizemos: O que podemos fazer se somos poucos, se não temos poder político
ou econômico?
Celebrar o dia
dos migrantes e dos refugiados é um desafio diante deste cenário internacional,
e mesmo no Brasil, onde crescem resistências aos haitianos, aos senegaleses,
aos ganeses, aos congoleses e a tantos outros que continuam a chegar ao nosso
País. As dificuldades ou crise econômica e política, às vezes como escusa,
levam a questionamentos no que tange ao acolhimento e proteção destas pessoas
em mobilidade humana.
Celebrar é
dizer não às violências, é romper o silêncio e contribuir para que o grito das
vítimas seja ouvido e suas palavras fundamentem políticas de acolhimento, de
solução dos conflitos, de reafirmação da dignidade humana acima das fronteiras
e dos interesses presentes na globalização da indiferença ou mesmo dos medos
infundados de que o outro seja um concorrente ou uma ameaça. Para que este
“dizer não às violências” seja verdadeiramente profecia é preciso seguir de
perto o que nos propõe o profeta Isaías (41,10):
Ø
Independente
de quão grave esteja a situação e os riscos pelos quais estão passando
migrantes e refugiados, há sempre uma certeza – o Senhor está conosco e nos diz
‘não tenhas medo’. O medo paralisa e muitas vezes nos impede de ver alternativas,
grupos de apoio e solidariedade, mãos amigas e fraternas. Não tenhamos medo!
Ø
É
Deus quem nos dá a coragem para persistir quando ‘tudo’ à nossa volta parece
nos levar à derrota. Deus se faz presente quando transformamos a boa vontade e
nossa fé em ações efetivas de proteção à vida humana, sem preconceitos ou
barreiras de qualquer ordem. A ‘AJUDA’ é gesto concreto que viabiliza
políticas, articula espaços de acolhimento, gera solidariedade, dinamiza a
criatividade na busca de soluções do que for emergencial e do permanente,
contribui para a continuidade de tradições e percursos identitários.
Enfim,
celebramos por acreditarmos que, juntos, estamos tecendo uma rede de
solidariedade cujos fios estão presentes por todo o Brasil nas várias
organizações, serviços e pastorais voltadas para o povo em mobilidade humana. São sinais, formas de presença, ações,
exemplos de doação que apontam e nos conduzem ao nosso sonho de uma terra sem
males onde todos possamos viver com dignidade, como filhos e filhas de Deus.
MENSAGEM DA PASTORAL DO MIGRANTE -
DIA DO MIGRANTE
Sociedade
e Migração.
Não
ao preconceito, por direitos e participação!
Que relações há entre a imigração contemporânea no
Brasil e as migrações de cerca de 240 milhões de pessoas em todo o mundo,
inclusive as da costa do mar mediterrâneo em direção a Europa?
Podemos considerar ao menos três aspectos comuns à imigração
no Brasil e no mundo: O primeiro é que muitos imigrantes são fugitivos da
pobreza; da vergonhosa desigualdade social; de perseguições políticas,
religiosas; preconceitos; de violências contra minorias étnicas; etc. O segundo
aspecto tem a ver com as mudanças climáticas aceleradas pelo intenso ritmo de
produção e consumo que está levando o planeta ao colapso ecológico e ameaça a
vida na Terra; do não acesso à água potável; de catástrofes naturais, como tsunamis,
terremotos. E o terceiro aspecto relaciona as migrações às crises econômicas;
guerras; grandes obras, grandes eventos; à impunidade de crimes como tráfico de
pessoas e trabalho escravo que, de acordo com a ONU (2013), logo atrás do
tráfico de drogas e de armas, são o terceiro crime mais praticado no mundo e
movimentam cerca de 32 bilhões de dólares por ano, o que os coloca entre as
atividades criminosas mais lucrativas da
economia globalizada; à escassez de políticas migratórias que viabilizem a promoção
do migrante como pessoa de direitos, de saberes que contribuem para o bem estar
das comunidades que o acolhem. A maioria dos 240 milhões de migrantes no mundo
atual vivencia problemas sociais semelhantes aos vividos por muitos imigrantes
que tentam melhorar ou recomeçar suas vidas em terras brasileiras.
Há motivos reais para alardes sobre uma “invasão de estrangeiros” no Brasil?
Segundo o Eurostat Statistic (2015),
em 2012 havia 33,3 milhões de imigrantes na Europa, ou 6,6% da população do
continente. A Alemanha e a França tinham, respectivamente, cerca de 12% e 11%
de imigrantes. Em 2013, os EUA tinham 46 milhões de imigrantes, 15% de sua
população. Já os brasileiros que vivem e trabalham em outros países chegam a
2,8 milhões de pessoas. Ora, os imigrantes que vivem e trabalham no Brasil são
cerca de 1,8 milhão de pessoas, ou, 1% de nossa população. É falso falar em
“invasão de estrangeiros” no Brasil. Isto só estimula o preconceito e a
xenofobia. Na verdade, a sociedade brasileira formada por imigrantes pode ou
deve buscar compreender a realidade da imigração; discutir e pressionar os
governos para implementar políticas migratórias humanitárias, como o direito
universal a acolhida.
Para além da xenofobia, preconceito étnico e racial: No final do Séc. XIX e início do Séc. XX, a
imigração no Brasil era branca, de origem europeia, voltada para o colonato e o
trabalho assalariado. Hoje, como antes, a imigração permanece voltada para o
trabalho; a condição social e econômica dos imigrantes de antes e dos de hoje
se caracteriza pela vulnerabilidade. Hoje, como antes, eles fogem da pobreza e
trazem a esperança de conquistar respeito, dignidade, e, também trazem a
capacidade de contribuir, a partir do seu trabalho, da sua cultura, para alcançar
melhor padrão de vida para todas as pessoas. O que mudou então para que a
xenofobia e o preconceito sejam tão acintosos como vemos nas redes sociais e
nas ruas? Mudou a cor da pele e procedência dos imigrantes. Antes eram brancos
europeus. Hoje são negros africanos e caribenhos destinados a postos de
trabalho de baixa remuneração, como babás, frentistas, caixas de supermercados,
açougueiros, ajudantes gerais, faxineiros, etc.
Há que se
considerar também a migração interna no
Brasil. Apesar de não constar na agenda política, ela é intensa e suas
causas não são diferentes daquelas que motivam a imigração internacional. Em
geral, os migrantes internos fogem de violências; da pobreza; conflitos
agrários; de enchentes devastadoras; da falta de água potável; etc. Se antes as
migrações internas eram percebidas através dos fluxos de nordestinos para a
Região Sudeste, de sulistas para as respectivas Regiões Norte e Centro Oeste,
hoje o mapa das migrações internas mostra fluxos migratórios mais complexos e
voláteis entre todas as regiões brasileiras. De acordo com o IBGE (2010), a
expansão do agronegócio e das grandes obras contribuiu para diversificar as
rotas migratórias e os rostos dos migrantes. Em sua maioria eles são Indígenas,
quilombolas, camponeses, ribeirinhos, operários, jovens (moças e rapazes) que
buscam trabalho, estudo, tratamento de saúde e trazem esperanças, saberes
vitais às nossas necessidades básicas, como alimentação, diversão, estudos,
serviços, etc.
Políticas públicas e
imigração: a
imigração não é um fato isolado, nem exclusivo de um país. Então, como tratá-la de forma articulada e com
foco na garantia de direitos? Não há fórmulas prontas e o caminho é sinuoso.
Porém, não há dúvida da urgência de políticas de gestão humanitária da
imigração, articuladas entre regiões de origem, trânsito e destino dos
migrantes. E nesse aspecto o Brasil precisa dar passos concretos e ágeis. Essas
políticas devem viabilizar processos justos e acessíveis de documentação,
acesso ao trabalho decente, à moradia, à saúde, ao aprendizado da língua, a
programas culturais e pedagógicos, como formas de inculturação, prevenção e
enfrentamento ao preconceito e à xenofobia.
Ao
abordar o tema sociedade e migração,
a Pastoral dos Migrantes convida todas as pessoas e instituições a considerar
os migrantes como dons e oportunidades de novos caminhos para a humanidade.
Eles nos convidam a abrir a mente, as economias, as políticas; a vencer o medo;
a enriquecer nossas culturas; estimulam-nos a derrubar fronteiras e revelam-nos
que somos filhos e filhas da mesma pachamama
(Mãe Terra). Trata-se de respeitar suas visões de mundo, saberes e
experiências fundamentais para a construção de outros mundos possíveis. E
possíveis porque já existentes nas práticas cotidianas de pessoas e
comunidades. Possamos assim recriar uma nova sociedade, na qual a pátria de
todos seja o mundo e o idioma seja o amor, que é sempre capaz de fazer novas
todas as coisas.
Serviço
Pastoral dos Migrantes – SPM- 30 anos rompendo
fronteiras com os migrantes!
21 de
junho/2015